De mim para mim

...Pois bem, sentaste-te e retiraste da mala um altruísmo sempre cândido, sempre cálido, sempre belo, sempre teu, e olhaste a mesa, já descomposta pelos famintos que a devoravam, com a superioridade das entidades celestes. Comeste como sempre comes - muito pouco – e criaste a tua atmosfera. Viveste como sempre vives, de ti para ti. Eu, entretive-me a olhar essa vivência e a buscar no teu olhar as regras que ninguém arrisca conhecer. Não resisti, pedi o teu número de telemóvel para expiar um grito que dentro de mim palpitava. Perdi a coragem mas não desisti. Entrei então num jogo que só o meu pobre aperto conseguiu justificar. Para não correr o risco de me negares, criei mensagens de mim para ti mas enviei-as a outras pessoas. Escrevi mensagens. Apaguei mensagens. Escrevi e apaguei. Escrevi e apaguei. Escrevi e apaguei. E criei, não apaguei, não enviei, pelo menos para ti. Enviei-as para mim. De mim para mim como se fosse de mim para ti. Senti a emoção que queria que sentisses ao recebê-las. E escrevi de mim para mim tudo o que queria dizer de mim para ti. A imaginação do que poderias sentir fez-me deambular entre o amor e o ódio sem me aperceber da sua fina barreira. E respondi àquilo que fingi teres recebido. Respondi por ti. Respondi como queria que respondesses. Por vezes dei em teu nome respostas difíceis mas deixei sempre uma brecha aberta para uma contra-resposta possível. E respondi a cada uma delas de mim para mim como se fosse de mim para ti. E tentei dar-te a volta mas foste tão difícil! Escrevi-me e respondi-me e foste sempre tão difícil! És tão difícil!
Sou difícil. Foste difícil. Sou difícil. És difícil. Sou difícil. Serás difícil. Sou difícil. Foste difícil. Sou difícil. És difícil. Sou difícil. Serás difícil. Sou difícil. Foste difícil. Sou difícil. És difícil. Sou difícil. Serás difícil.

Integrei nestes jogos o passado o presente e o futuro e tu estiveste sempre em cada um deles. Brinquei com as palavras. Amei as palavras. Fiz-te palavras como se te fizesse filhos!